NÃO RIA QUE É SÉRIO:
FILOSOFIA E HUMOR NAS FRASES DE MARCELO.
Horácio Paiva
Poeta e advogado
(horacio_oliveira@uol.com.br)
Natal, 25 de junho de 2012. Chove. Estou diante de Marcelo Rocha Coelho, o mesmo e o outro. O mesmo, há mais de quarenta anos, quando o conheci em Recife, na Agência Centro do Banco do Brasil, às cinco da tarde, na hora da poesia. Viera transferido de Brasília, que não suportara. “Uma cidade sem esquinas”, dissera-me, lembro-me (e deduzi: despida de bares de esquina, para alimentar sua veia boêmia). E começamos uma amizade interminável. A inteligência, a sensibilidade, o humanismo, a verve, e até sua inquietude, conquistaram-me. O liame da poesia, como sempre, fora essencial. E ainda hoje lembra e repete o poema Bach en Automne, do francês Jean-Paul de Dadelsen, que à época traduzi, e cujos versos iniciais dizem:
“Anjo da Melancolia
que posso eu contra ti?
Tu me conheces melhor
do que eu mesmo...”
Marcelo, o múltiplo, que não usou, a exemplo de Fernando Pessoa, heterônimos, é autor com estilo e escritos variados, onde se revela sensível observador da existência, interagindo com o meio social e humano, do qual é ator, testemunha e interlocutor. E daí extrai poemas, artigos, crônicas, ensaios e documentários que encantam.
Com formação acadêmica em engenharia civil, excelente calculista, nunca exerceu a profissão. Mas não é o primeiro, nem será o último matemático a dedicar-se à literatura. Apenas para citar dois outros exemplos: vemos, ao longe, o grande poeta e matemático persa, Omar Khayyam; e aqui perto, no mesmo Recife, temos (ou tivemos, porque infelizmente já faleceu) Joaquim Cardozo, o excelente poeta de “Congresso dos Ventos”, genial calculista que ajudou Niemeyer e Lúcio Costa na edificação de Brasília.
E o que não dizer de sua fase de locutor radiofônico, ainda bem jovem, nas emissoras de sua amada Caicó, na marcante década dos anos sessenta? Criativo - e fazendo jus ao dito de Ezra Pound, de que os artistas são as antenas da raça - foi o responsável pelo lançamento da música dos beatles naquela cidade. Aliás, embora nascido em Sousa, na irmã Paraíba, ousaria mesmo dizer que a sua alma de jovem e apaixonado formou-a Caicó...
Retratou e amou a província. Entretanto, não duvido: sua perspectiva é universal. Como Anaxágoras e Demócrito, filósofos gregos, a sua pátria é o universo. E aqui temos o outro Marcelo, o frasista exemplar, que surge em seu novo livro.
“NÃO RIA, QUE É SÉRIO!”, adverte o título. E ainda na capa, logo abaixo, a explicação: “Filosofia com toques de humor”.
Há uma ordem de assuntos no livro que se desenvolve em cabalísticos sete subtítulos capitais: “A luta desigual de cada dia”, “Encontro de contradições”, “Ver para descrer”, “Conclusões pouco edificantes”, “O horizonte à distância”, “A desunião do amor”, “A última sobrevivência”.
Imagino que a frase lítero-filosófica está para o ensaio assim como o hai-kai está para o poema. E às vezes esses pequenos ensaios frasísticos também são verdadeiros poemas, como essa bela frase de Marcelo Coelho:
“Eu posso desacreditar de quase tudo, mas ainda acredito que deve existir alguma coisa real que dá legitimidade aos sonhos.”
Anunciar e julgar são coisas distintas. E aqui faço o papel de profeta que anuncia o advento de mais um bom livro, cujas reflexões levarão o leitor ao tempo da consciência. Terá, pois, a oportunidade, esse leitor audaz, interagindo com a criatividade e o raciocínio, de vivenciar ou mesmo construir momentos que sobrepujam o consumismo e o imediatismo reinantes em nosso mundo atual.
Horácio de Paiva Oliveira.
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